Como decidir publicar a sua pesquisa

Alguma vez na vida você já sofreu com a síndrome do impostor? Trata-se de um padrão psicológico (não é uma doença) no qual as pessoas duvidam constantemente de suas capacidades e de seus méritos atingidos, ainda que elas tenham sido validadas por agentes externos (ex.: prêmios, títulos, pessoas relevantes da área, etc.).

Publicado em 17/07/2020 por Luzia Kikuchi

Alguma vez na vida você já sofreu com a síndrome do impostor? Trata-se de um padrão psicológico (não é uma doença) no qual as pessoas duvidam constantemente de suas capacidades e de seus méritos atingidos, ainda que elas tenham sido validadas por agentes externos (ex.: prêmios, títulos, pessoas relevantes da área, etc.).

E, curiosamente, essa síndrome é mais comum em pessoas de nível de capacitação mais alto que a média da população, tais como pós-graduandos, pessoas que ocupam cargos de liderança, etc. Quanto à frequência, parece atingir tanto homens quanto mulheres, mas parece haver uma incidência mais alta em mulheres, devido ao próprio contexto histórico e sociocultural delas.

E quais os sentimentos mais comuns na síndrome do impostor?

Por mais que a pessoa tenha estudado e se dedicado tempo suficiente sobre um assunto, a sensação é quase que inversamente proporcional: quanto mais se estuda, menos parece que sabe. Quando esse sentimento não é controlado de forma saudável, pode incapacitar a pessoa de contribuir com o seu conhecimento que poderiam impactar positivamente na sua área, no seu trabalho ou na sua família.

Segundo os pesquisadores da Universidade Estadual da Georgia, Joe Langford e Pauline Rose Clance* esse sentimento é mais frequente em pessoas que são introvertidas e que buscam uma constante aprovação das pessoas. Além disso, parece ser mais comum em pessoas que vêm de contextos familiares com pouco amparo emocional. Esse estudo foi publicado em 1993, na revista Psychotherapy e você pode acessar o texto na íntegra no site oficial da pesquisadora (em inglês).

* Pauline Clance e Suzzane Imes foram as primeiras a cunhar o termo Síndrome do Impostor, em 1978.

Bom, e por que eu comecei este texto contextualizando um pouco a síndrome do impostor para falar sobre o assunto deste post? Porque é exatamente essa sensação que fica em nossa mente quando estamos muito tempo dedicados numa pesquisa. Quanto mais nos aprofundamos em um assunto, maior é a sensação de “impotência” e de que é necessário estudar muito mais para tentar entendê-lo melhor. Dessa forma, qualquer coisa que pensemos em divulgar ou publicar parece ser irrelevante para o “mar de conhecimento” que existe por aí.

Por isso, vou apresentar alguns questionamentos principais para você poder avaliar se o que está pesquisando merece ou não ser publicado.

Questão 1: Você já fez um levantamento bibliográfico do assunto em questão?

Se você já fez uma breve revisão ou levantamento bibliográfico, provavelmente, deve ter uma noção de como o assunto que você está pesquisando está sendo tratado nas principais literaturas.

E dentro do assunto que pesquisou, sempre tem algo novo a ser incorporado. Por exemplo, se você encontrou uma pesquisa que foi aplicada numa cidade X, nada te impede de tentar comparar os resultados aplicando em uma cidade Y, por exemplo. Dessa forma, sua pesquisa já pode acrescentar mais dados sobre uma nova perspectiva. E isso já é algo que mereceria ser comunicado.

E se, eventualmente, você perceber que não existe ainda trabalhos significativos sobre o assunto que está pesquisando. Será que ele merece ser comunicado? Assim passamos para a questão 2.

Questão 2: Um tema ou assunto inexistente na literatura é relevante?

Bom, aqui já vem uma parte complicada e que exige um pouco mais de experiência. Muitas vezes, podemos ter duas reações ao fazer um levantamento bibliográfico e notar que não há muita publicação referente ao assunto que estamos pesquisando:

  1. Pensar que não pesquisou direito todas as bases;
  2. Pensar que não é relevante.

A primeira reação pode ser genuína, pois alguns assuntos podem não aparecer no idioma que está pesquisando. Por isso, se você tiver facilidade com outros idiomas, faça também a busca em outras bases.

Para busca de artigos em outros idiomas, uma base interessante para se usar é o DOAJ (Directory of Open Access Journal) que é um diretório que busca os periódicos e artigos de acesso livre em mais de 133 países.

Suponhamos que tenha procurado em outras bases e outros idiomas que tem acesso e ainda não encontrou nada a respeito do seu assunto. Talvez agora você tenha certeza da segunda reação: de que não é relevante.

Crédito da imagem: Tookapic

Mas, antes de você se desesperar e sair jogando o seu trabalho para o alto, por que não pensar em organizar suas ideias para que possa ser validada pelos seus pares?

Questão 3: Você tem medo de receber críticas?

Uma coisa que se deve ter em mente quando se faz pesquisa é de que não fazemos isso para agradar alguém ou ser agradado. Então, se você tem algum assunto que acredita ser importante de ser discutido pela sua área e tem alguma perspectiva nova a ser apresentada, é sempre válido comunicar isso.

Muitas vezes, o nosso medo de divulgar é justamente de receber críticas do nosso trabalho. Principalmente, quando elas são negativas. Por isso que comecei este texto falando sobre a síndrome do impostor, que é talvez o responsável por esse medo que nos “imobiliza” de publicar os nossos trabalhos e achar que não temos material relevante para apresentar. Isso nada mais é do que o medo irracional de poder ser julgado como incompetente. E esse medo tem um preço: você pode demorar demais para divulgar algo que já poderia contribuir de forma significativa para a sua área.

Questão 4: Você acredita que a ciência se faz sozinha?

Existem pessoas que pensam que a ciência só avança quando supostamente uma única pessoa ou um “gênio” tem uma grande ideia que ninguém havia pensando antes. Na verdade, as ideias novas só podem surgir se você as compartilha com outras pessoas. E mesmo que não seja necessariamente um contato pessoal, alguma fonte de informação inspiram as pessoas, tais como: livros, obras de arte e artigos. 

Um ponto importante a se dizer é que a ciência só pode ser considerada como tal quando ela pode ser refutada. Ou seja, nada é uma verdade absoluta. A validade de alguma teoria só é aceita quando muitos cientistas entram em um consenso, pois chegam em resultados semelhantes até chegar a uma nova que contradiz tudo. E é assim que a ciência avança. Thomas Kuhn, um físico e filósofo da ciência, foi um dos pioneiros a trazer o conceito de Revolução Científica que envolve tais conceitos do que é a ciência. Não vou me aprofundar muito nesse assunto neste post, para não desviar do assunto. Talvez em algum momento eu trate sobre ele isoladamente.

Se você quiser ler um pouco sobre as ideias principais de Thomas Kuhn, tem um artigo da Profª. Dra. Fernanda Ostermann da UFRGS, que ajuda a entender um pouco sobre ele.

Portanto, se a sua pesquisa traz uma contribuição que ajuda a entender um pouquinho mais sobre um assunto, isso já é algo que deveria ser compartilhado com a comunidade científica.

Questão 5: Você seguiu corretamente o método científico?

Em dois posts anteriores, eu apresentei um passo a passo de como escrever um projeto de pesquisa e um artigo científico. Então, se você consegue apresentar os dados da sua pesquisa com uma fundamentação teórica e uma justificativa depois de ter feito toda sua pesquisa de levantamento bibliográfico, ele pode ser um material em potencial para ser publicado.

Por isso, meu caro leitor ou minha cara leitora, tente pensar nessas cinco questões que apresentei anteriormente. Com esses questionamentos, provavelmente, você conseguirá decidir se sua pesquisa merece ou não ser publicada.

Agora, se você está com dúvida de onde é melhor publicar sua pesquisa, você pode consultar este post para ter uma ideia.

Deixe nos comentários o que mais te imobiliza na hora de publicar a sua pesquisa.

Assista também a este vídeo numa versão resumida e compartilhar com mais pessoas essas ideias: