Como começar a faculdade do jeito certo?

A faculdade é o marco de um momento da sua vida na qual, teoricamente, você está lá porque escolheu. Ou seja, é diferente de estudar por obrigação como costuma ser para muita gente no Ensino Básico. Mas, nem tudo são flores.

Publicado em 18/03/2022 por Luzia Kikuchi

Então você passou na faculdade. Dedicou-se por horas e horas, dependendo do caso, abdicando-se de finais de semana e feriados para poder conquistar aquela sonhada vaga na universidade. Mas, e depois? Será que você já está pronto ou pronta para assumir os compromissos exigidos no Ensino Superior?

A faculdade é o marco de um momento da sua vida na qual, teoricamente, você está lá porque escolheu. Ou seja, é diferente de estudar por obrigação como costuma ser para muita gente no Ensino Básico. Mas, nem tudo são flores. O nível de exigência no Ensino Superior é muito maior, não só nos conteúdos, mas também na própria maturidade para enfrentar os compromissos acadêmicos dentro da faculdade.

Eu já tive a experiência dos dois lados: como aluna e como professora. Como estudante, posso dizer que, no começo, foi difícil me adaptar a dinâmica das aulas e, principalmente, ao ritmo das aulas e dos estudos, que costuma ser bem exigente. Mas, existem alguns “hábitos” trazidos do Ensino Básico que são os grandes responsáveis em tornar o acompanhamento das aulas na faculdade muito mais penoso do que poderia ser. E, neste post, pretendo elencar alguns desses hábitos, em três diferentes quesitos, para que os evite desde o começo.

  1. Engajamento

Já se foi o tempo em que o “aluno ideal” é aquele que copia toda a matéria da lousa e fica absolutamente em silêncio durante as aulas.

Ok, mas, isso não quer dizer que você deva atrapalhar as aulas com conversas paralelas e não fazer anotação alguma durante a explicação do professor, que pode ser importante no momento que for estudar para uma prova, por exemplo.

O que eu quero dizer é que existem maneiras diferentes e mais eficientes de acompanhar as aulas. Isso significa que ficar simplesmente copiando, palavra por palavra, o que está escrito na lousa e ficar em absoluto silêncio com o pensamento “longe”, enquanto o professor explica, não é a melhor maneira de acompanhar uma aula. Ainda mais, quando se está no Ensino Superior. E agora vou trazer a minha experiência como lado de professora para explicar esse contexto.

“Engajar é tentar compreender o conteúdo”

Quando eu preparo minhas aulas na faculdade, eu tento prepará-las em slides de apresentação, mas não para ser usado como material de referência. Eles servem apenas como um índice da sequência da aula, dados interessantes ou imagens que contextualizem o conteúdo que está sendo apresentado. E esse material sempre é disponibilizado ao final da aula no ambiente virtual de aprendizagem (AVA) da universidade. Quando não existe essa opção, envio também por e-mail ou compartilho algum link de armazenamento em nuvem por onde os estudantes possam baixar o material.

Por isso, a regra número 1 nas minhas aulas é: não copiar e interagir às perguntas que vou fazendo para conduzir a aula.

É claro que essa dinâmica funciona para a forma como eu organizo a aula. Talvez seja mais difícil quando professores lecionam no modelo catedrático que é aquele no qual o docente expõe todo o conteúdo e, no máximo, depois da exposição, abre para perguntas e dúvidas dos alunos.

Mas, mesmo para esses tipos de aula, em vez de ficar copiando os conteúdos ditos ou escritos pelo professor, te desafio a tentar prestar atenção na explicação e sintetizar os pontos importantes. E, para isso, pode ser usado, por exemplo, o Método Cornell, que já falei neste post e também neste vídeo:

Por que esse exercício é importante?

Quando você tenta reorganizar o que está sendo explicado com as suas próprias palavras, será desafiado a buscar os seus conhecimentos prévios e compreender as lacunas existentes na sua aprendizagem, que é um exercício muito mais crítico e menos passivo durante as aulas.

Mas, aqui vai um alerta: não é nada fácil fazer isso. Eu mesma só consegui desenvolver essas habilidades de forma eficaz, mais para o final da faculdade no meio da pós-graduação. Contudo, se você conseguir exercitá-lo desde o ensino básico, haverá um ganho muito maior para aprender conteúdos mais complexos no futuro, principalmente, na faculdade.

“Engajar também é desenvolver o senso crítico”

Não é porque o professor está dizendo que você precisa aceitar tudo como se fosse a absoluta verdade.

Ok, parece contraditório. Já que o professor, tecnicamente, tem mais experiência e vivência do que o estudante naquele conteúdo que está lecionando. Mas, lembre-se que, para tudo na vida, há mais de um tipo de interpretação sobre um determinado assunto. E o professor está trazendo alguns deles, baseado em sua formação, os referenciais escolhidos, sua vivência e também, de certa forma, em suas crenças. E, na universidade, somos desafiados a desenvolver o nosso olhar mais crítico e menos ingênuo sobre o que aprendemos e isso inclui questiona-se sobre o ensino dogmático*.

* Segundo o dicionário Houaiss, de língua portuguesa, dogmático é o mesmo que “dogmas e dogmatismo; que se apresenta com caráter de certeza absoluta ‹as verdades d. da fé› ‹refutar críticas com afirmações d.›”.

Ou seja, isso significa que, dependendo do conteúdo que o professor ensina, ele nunca estará isento de um viés. Contudo, também não é razão para desconfiar de tudo que o professor fala rs. Pelo contrário, absorva, tente entender, pergunte, caso não tenha ficado claro, e também tente encontrar outros pontos de vista.

Talvez para a área de humanidades, esse processo seja mais natural e menos comum nas ciências exatas. No entanto, mesmo dentro da área de Exatas, por exemplo, no ramo da História da Matemática, existem certos corpos de conhecimento que são apresentados de acordo com o que o estudioso nos apresenta, baseando-se no consenso adotado entre povos. Um exemplo clássico disso é a famigerada “briga” para decidir quem é o pai do Cálculo: Newton ou Descartes. Fiz uma postagem mais detalhada neste post do Quora.

Por isso, quanto antes você desenvolver esse hábito de procurar por conta própria os seus materiais de estudo, mais independência terá nos seus estudos. Lembre-se apenas de procurar por fontes de informação que sejam confiáveis: artigos científicos publicados em revistas revisadas por pares, livros ou blogs escritos por especialistas credenciados na área.

Obviamente, existem especialistas que falam bobagem? Certamente. Mas, a quantidade deve ser muito menor do que alguém que não passou por “crivo” algum. O conhecimento se constrói conforme compartilhamos com os nossos pares. Isso inclui sermos avaliados, refutados e, com isso, aprendermos a argumentar para defender nossos pontos de vista, até que isso passe a ser ou não um consenso. O trabalho de um cientista, basicamente, se resume a esses processos.

E, agora, vamos passar para o próximo quesito.

  1. Desempenho

“Pare de pensar apenas em nota!”

Se tem uma coisa que me “tira do sério” quando dou aula na faculdade, é quando um estudante coloca o seu foco apenas nas notas.

Tudo bem, ela consiste em uma parte importante da sua carreira acadêmica. Mas, não pode ser o “motor” de suas atividades. Lembre-se que você não está mais na escola básica. Você não precisa mostrar o boletim para os seus pais (eu acho e espero que não). Então, coloque como prioridade o quanto aqueles conteúdos podem contribuir para a sua formação profissional. Pois são aqueles que vão determinar se você estará ou não apto ou apta para o mercado de trabalho.

Portanto, não se vive a faculdade somente de aulas. Ela é, sem dúvidas, uma porção muito relevante. Porém, são os contatos, as vivências com outros colegas de contextos diferentes que te farão um profissional versátil para o futuro. Inclusive, também participar de grupos, grêmios e associações.

No vídeo que vai ao ar às 21h, eu explico, o que é, por exemplo, uma empresa júnior e também dou algumas dicas específicas para aproveitar melhor a forma de escolha das suas disciplinas, caso você estude numa universidade pública.

Por fim, para quem já acompanha este blog há algum tempo, já deve saber o último quesito que é organização.

  1. Organização

Da minha experiência, posso dizer que organização foi o ponto essencial para que eu pudesse encarar os projetos com seriedade e qualidade. Explico.

Quando você não tem organização, há uma chance muito grande de cair na já falada “Falácia do Planejamento”, popularizada por Daniel Kahneman neste livro. Basicamente, quando você cai neste viés cognitivo, tende a fazer planejamentos muito “otimistas” que tendem a subestimar a complexidade e o tempo necessário para a realização das tarefas.

Em termos simples, é quando a pessoa acha que é capaz de sair de um bairro da cidade de São Paulo, no final da tarde de sexta-feira, e ir para a outra ponta da cidade, levando em consideração apenas o tempo levado no trajeto que ela fez numa manhã de domingo. Dentro desse plano, podem ocorrer outras variáveis como: trânsito carregado, desvio, o transporte fica indisponível e entre outras. Por isso, se você tiver um compromisso inadiável, o mais adequado seria sair com muita antecedência para evitar imprevistos. Já a pessoa que cai na Falácia do Planejamento não sabe se programar para isso. Muito provavelmente porque tende a marcar muitos compromissos ao mesmo tempo, sem levar em consideração outros fatores imprevisíveis.

E isso pode acontecer em qualquer área da sua vida: desde projetos que entrega pela metade, porque não levou em consideração outros compromissos que poderiam se sobrepor no meio do caminho, planejamento financeiro otimista para uma obra da casa e ela sair muito acima do esperado e, inclusive, nos estudos.

Parafraseando uma das ideias de Nathalia Arcuri, em seus vídeos, que sempre orienta a não confiar em si mesmo no momento de controlar os gastos, eu traria para um contexto educacional dizendo “não confie no planejamento de cabeça para qualquer coisa”.

Isso significa colocar no papel todos os seus compromissos, avaliar se realmente será capaz de atender as demandas com qualidade e, claro, levando em consideração que o descanso e o lazer também são fundamentais para continuar exercendo as atividades de forma adequada. Já falei neste vídeo com um exemplo inspirado no que o Prof. Pierluigi Piazzi usa em muitas de suas palestras.

Espero que esses três quesitos que coloquei para ajudar a identificar certos “maus hábitos”, que trazemos da nossa época de escola básica, te ajudem a começar a faculdade do jeito certo.

Deixe nos comentários também em qual modalidade de ensino você está cursando o seu ensino superior: EaD ou presencial?