Como organizar os estudos?

Publicado em 01/05/2020 por Luzia Kikuchi

Continuando com a série de dicas de estudo, semana passada postei sobre como se focar em uma atividade. Hoje vou mostrar como organizar, de forma realista, para os seus estudos. Então, partindo do pressuposto que você já sabe as técnicas de manter o foco, agora vou ensinar como se organizar de uma forma eficiente.

Antes de tudo, preciso esclarecer que há técnicas diferentes de acordo com o tipo de conteúdo, sobretudo nas ciências humanas e nas ciências exatas. Então, para não ficar muito confuso, vou dividir este texto em três sessões, clique na sessão que você tiver mais interesse ou siga lendo o texto completo.

  1. Organização geral
  2. Para área de humanidades
  3. Para área de exatas
  1. Organização geral

Agenda:

É essencial que você tenha uma agenda, digital ou física, para ter uma visão geral dos seus compromissos principais e, aqui, um segredo: prefira por agendas que mostram o calendário do mês inteiro. Se você não encontrar, você pode optar pelas seguintes alternativas (de acordo com o seu orçamento):

I) Quadro magnético

Vantagem: Reutilizável
Desvantagem: Preço (custa em média R$ 40 a R$ 50) e não é portátil.
Crédito da imagem: acervo pessoal

II) Folhas digitais em PDF (para ser editado no tablet ou imprimir)

Vantagem: Facilidade para transportar e baixo custo.
Desvantagem: Depois de um tempo gera acúmulo de folhas (caso opte por imprimir), se for usar no tablet, gera menos lixo, mas precisa ter esse dispositivo para utilizar.
Crédito da imagem: acervo pessoal

Se você quiser baixar o seu, pode acessar este site e personalizar o formato de acordo com a sua preferência.

O aplicativo que uso para editar o PDF é o Squid (para Android). Infelizmente não está disponível para iPad, mas deve existir uma alternativa. Quem souber, pode deixar a dica nos comentários.

III) Faça você mesmo (DIY) em um caderno

Vantagem: Facilidade para transportar e baixo custo.
Desvantagem: Pouca, só precisa de um tempinho para fazer o seu.
Crédito da imagem: acervo pessoal

Nessa agenda de sua escolha, você deve anotar quais são os dias para entregar os trabalhos, os dias de prova, etc. É interessante que o calendário seja exclusivo para o seu estudo, mas sabemos que hoje costumamos ter muitos compromissos ao mesmo tempo. Então, tente anotar tudo no mesmo lugar, pois assim você terá uma noção realista do tempo que poderá se dedicar a cada atividade. 

Mas por que anotar o seu planejamento é importante?

No livro “Os 7 hábitos das pessoas altamente eficazes” de Stephen Covey, ele mostra que uma das técnicas de organizar tarefas muito utilizadas entre pessoas que conseguem deixar muitos dos seus compromissos em dia é manter um cronograma.

Mas, muito além de uma dica de “autoajuda”, isso é explicado pela ciência. Essa técnica evita que você caia na Falácia do Planejamento, que consiste em realizar planos e planejamentos fora da realidade, levando em consideração apenas os cenários otimistas.

Isso quer dizer que o nosso cérebro é muito ruim em fazer estimativas. E a nossa tendência é levar em consideração apenas os fatores otimistas (viés do otimismo ou optimistic bias). Então, se você tem um trabalho para entregar daqui a 15 dias, a tendência do seu cérebro é imaginar que em poucas horas, em um determinado dia, você será capaz de fazer tudo que precisa, não levando em consideração imprevistos no meio do caminho.

Se você visualiza quantas tarefas tem de fato e quanto tempo será necessário para cumprir com a data limite de cada uma, você já melhorará bastante na sua estimativa de tempo que levará para cada tarefa, mesmo porque você aprenderá com os seus erros para o planejamento futuro.

O termo Falácia do Planejamento ou Planning Fallacy foi cunhado pelos teóricos Daniel Kahneman e Amos Tversky, estudiosos da área de Psicologia Cognitiva aplicada na Economia Comportamental. Daniel Kahneman inclusive é ganhador do prêmio Nobel de Economia. Amos Tversky, apesar de ter contribuído amplamente nas pesquisas, infelizmente, faleceu antes da premiação. Recomendo o livro Rápido e Devagar: duas formas de pensar para saber mais sobre o assunto.

Autor: Daniel Kahneman
Tradução: Cássio Arantes Leite
Editora: Objetiva
Crédito da imagem: www.amazon.com.br

Local de estudo:

Defina um local de estudo, de preferência, que seja sempre no mesmo lugar e, se for na sua casa, que não tire muito a atenção como TV, computador, pessoas passando o tempo todo ou conversando. (Nem preciso falar do celular, que expliquei no último post).

Claro que, nem sempre, podemos ter tais privilégios em casa. Eu mesma, na época do vestibular, dividia um quarto pequeno com o meu irmão mais novo e sequer havia porta para separar os ambientes. Também não havia outro cômodo na casa onde eu pudesse me sentar tranquilamente para estudar. Por isso, sempre dei preferência por estudar na sala de estudos do cursinho ou na biblioteca da faculdade. 

Porém, desde essa época, eu acabei me acostumando a usar fones de ouvido e ouvir música instrumental para tentar camuflar os barulhos que me incomodam enquanto estudo ou trabalho e que tem funcionado muito bem. A Psicologia ainda não consegue explicar se essa técnica é eficaz para todos, mas há um *estudo relativamente recente (maio/2019) publicado na APA (American Psychological Association – Associação Americana de Psicologia) sobre o assunto indicando que, dependendo do tipo de atividade, da música e da personalidade da pessoa, essa solução parece ser eficaz. Portanto, você pode testar essa dica e ver se funciona, ok?

*Se você pertencer a alguma instituição de ensino que tem acesso ao portal de periódicos da CAPES, você pode logar com a sua conta para poder acessar ao texto completo do artigo.

Uma última dica sobre o local de estudo: se possível, evite que esse lugar seja a sua cama ou sofá para não ter o problema de cair no sono ou também de não conseguir relaxar no momento de descanso. No post do instagram, dei dicas de como ensinar a distância.

Material de estudo:

Separe todo material de estudo que precisará para não ter que ficar levantando e buscando o tempo todo. Livros, cadernos e estojo devem estar ao seu alcance.

Essa dica é importante para que o seu “cérebro não arranje desculpas” de tentar mudar o foco da tarefa, pois ele é muito “esperto” para tentar economizar energia. E tarefas mais complexas, exigem mais esforço. No capítulo 3 do livro Rápido e Devagar, que indiquei anteriormente, explica exatamente sobre esse efeito de nosso cérebro. E também mostrei no início do vídeo Como ter foco? um exemplo parecido quando vamos tentar estudar.

  1. Para área de humanidades

Não faça resumos!

O que vou falar agora talvez vá decepcionar milhares de fãs de resumos e fichamentos bonitos, alguns que até utilizam técnicas de caligrafia. Aliás, digo de antemão que também sou fã. Sigo muitos perfis que mostram fotos bonitas desses resumos que merecem virar quadros. Porém, quem explica é a ciência. E ela constatou que fazer resumos ou utilizar marca-texto pouco contribui para a eficácia nos estudos.

Acredito que fazer resumos e grifar o texto é uma técnica amplamente utilizada pelas pessoas. Posso dizer por mim que o hábito de fazer resumos vem desde pequena. Minha mãe* sempre me incentivou a ter o caderno bem organizado. Quando ela achava que não estava bom, me obrigava recomendava passá-lo a limpo. Esse hábito fez com que eu me tornasse uma pessoa “obcecada” em copiar tudo que o professor escrevia na lousa e deixar todas as anotações bonitas e arrumadas. Quando ele ou ela passava muita coisa, muitas vezes, tinha que passar horas em casa passando as anotações a limpo para que o meu caderno ficasse impecável.

E, por causa desse costume, eu sempre perdi muito tempo fazendo resumos e mais resumos de textos das disciplinas de humanas e que nunca contribuíram de forma significativa para o meu aprendizado. Fui perceber só muito tempo depois que aquela técnica não estava sendo eficaz e comecei a adotar diferentes estratégias, muito por tentativa e erro mesmo, até que cheguei em uma que realmente funciona.

Daí, me perguntei: “Por quê?”

De acordo com uma pesquisa liderada pelo pesquisador John Dunlosky da Universidade de Kent, no Reino Unido*, a forma mais eficaz de estudar é testar a si mesmo e revisar de forma distribuída e contínua.

*Errata: John Dunlosky pertence à Universidade de Kent, que fica nos Estados Unidos. Existe uma universidade com nome homônimo no Reino Unido.

Testar a si mesmo, neste caso, seria tentar resgatar da memória sobre um tema e explicar com as suas próprias palavras. Por isso, ao ler um texto, o interessante seria anotar algumas palavras-chave ou perguntas-chave para depois tentar dissertar sobre o tema. Aliás, no post anterior explico um pouco sobre o processo de fazer perguntas retóricas. Você pode fazer isso sozinho, mas se conseguir discutir com um colega será ainda mais efetivo para o seu aprendizado.

Revisar de forma distribuída significa que você não deve acumular uma grande quantidade de conteúdo para estudar na véspera da prova. Obviamente, dependendo da sua capacidade de memorização, você pode até conseguir passar nos exames, mas dificilmente reterá esse conteúdo por muito tempo (explico isso também no primeiro post do blog sobre aprendizagem mecânica e significativa). Assim como ninguém corre uma maratona treinando na véspera da corrida, por que deveria ser diferente com os estudos, não é mesmo? 😅

*Mãe, sei que fez tudo isso com a melhor das intenções, mas hoje eu sei pela ciência que fazer resumos e deixar o caderno organizado não era a melhor estratégia para os estudos… Então, não fica brava, tá? 😀

Para quem quiser ler a pesquisa comprovando essa eficácia, ela está em inglês, mas segue o link. É um artigo bastante extenso, mas vale a pena para quem tiver interesse.

E é por esses motivos que, nas minhas aulas, eu sempre incentivei os alunos a prestarem atenção no que eu explico em vez de se preocuparem em copiar o conteúdo da lousa ou dos slides pois, posteriormente, disponibilizaria as anotações de aula pelo Moodle ou e-mail.

  1. Para área de exatas

Resolver muitos exercícios não é eficaz!

Segundo essa mesma pesquisa da Universidade de Kent, distribuir o conteúdo ao longo do tempo é a melhor forma de aprendizado, como já citado no tópico anterior. No entanto, comumente, os conteúdos dos cursos são trabalhados em blocos de acordo com o tópico, ou seja, o assunto não é trabalhado de forma intercalada durante o curso. Não entrarei nessa discussão específica sobre os conteúdos didáticos neste texto para não me estender muito. Cito apenas como forma de contextualizar o problema.

No caso do estudo da Universidade de Kent, da mesma forma como a distribuição do conteúdo ao longo do tempo testada pelos pesquisadores, citaram um outro estudo conduzido por Taylor e Rohler (2010) que demonstrou a eficácia de intercalar atividades práticas durante o aprendizado de um novo conteúdo matemático.

Isso significa que, em vez de trabalhar apenas com a aplicação de fórmulas e resolução de muitos exercícios parecidos, o que tem demonstrado mais eficácia ao longo prazo é resolver exercícios de diferentes dificuldades e que misturem diferentes habilidades em um único problema. Isso faz com que o aluno aprenda a generalizar a resolução de um problema.

No entanto, o estudo também aponta que, o aprendizado em blocos e por repetição é mais efetivo quando a avaliação é feita logo após a prática extensiva. No entanto, quando se tem uma grande quantidade de conteúdo a ser estudado (por exemplo, como no vestibular), aqueles que estudaram de forma intercalada tiveram um resultado muito melhor do que os primeiros. Portanto, não se foque no volume de exercícios, mas na progressão da dificuldade deles.

Não há ainda muitos estudos sobre a eficácia de práticas intercaladas na aprendizagem, mas os poucos que foram aplicados têm mostrado resultados muito promissores. No caso da matemática, conheço alguns estudos que demonstram a eficácia de trabalhar com a abstração ou generalizações desde cedo em vez de limitar apenas a situações concretas. Mas, também é um assunto que posso escrever em um outro post.

Conte nos comentários se você se surpreendeu com essas dicas baseadas na ciência ou se já conhecia alguma delas. Também conte se você conhece outras pesquisas que falam sobre eficácia no aprendizado.

Assista também aos dois vídeos publicados sobre o assunto no canal!

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